quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Entrevista: Deputado Eleito Major Rocha (PSDB/AC)

Deputado estadual eleito no Acre, Major Rocha (PSDB) é considerado a surpresa das urnas naquele estado. Com 4.228 votos, essa liderança dos trabalhadores da Segurança Pública promete mudar as condições de trabalho impostas aos policiais militares acreanos.

“Nossa carga horária é desumana e isso precisa acabar. Então a gente pretende apresentar um projeto de lei que estipule nossa carga horária em 30h”, afirmou o deputado ao Blog do Capitão Assumção. Além disso, Major Rocha também vai lutar por mudanças no regulamento disciplinar dos policiais militares do seu estado.

Para ele, a PEC 300 “foi uma das coisas mais importantes que aconteceu” porque possibilitou a integração dos bombeiros e policiais militares dos diversos estados.

Por fim, ele destaca a importância de os profissionais da Segurança Pública eleger seus legítimos representantes para cargos públicos. “Temos de batalhar e conscientizar nossa categoria, mais do que nunca, da importância de temos representantes para falar por nós... A gente tem de ter alguém que fale pela gente, tem de ter alguém que lute pelas nossas causas!”


Leia a entrevista completa com o Deputado Eleito Major Rocha


Conte um pouco de sua história na Polícia Militar do Acre.

Tenho 42 anos, sou Bacharel em Segurança Pública, Bacharel em Direito e estou concluindo o curso de Jornalismo. Tenho 20 anos na corporação e já passei pelo comando de várias unidades. Em Rio Branco mesmo, na capital, quase todas as unidades eu já comandei. E no interior eu passei muito tempo em Sena Madureira, que é a terceira cidade do Estado. Cheguei aspirante e saí capitão dessa cidade. Fui comandante durante seis anos lá. Então eu tenho uma história... E tenho uma relação muito forte com a tropa. Eu fui comandar como aspirante uma companhia e lá era eu e os policiais. Os cabos, soldados, sargentos e o sub-tenente. Então, eu saí da Academia sabendo o que tinha de teoria, mas o prático mesmo, a vivência da atividade policial, eu aprendi com eles.

Então eu desenvolvi uma relação muito estreita, muito próxima com os policiais. E isso veio se fortalecer quando eu vim para a capital comandar unidades maiores. Então a gente desenvolveu o mesmo trabalho, sempre com essa visão de trabalhar junto, de apoiar o policial, de estar junto com eles nas missões. E prestar a assistência de que ele precisa. É mais do que aquela coisa de estar só no gabinete assinando ofícios e outras coisas mais, fazendo aquela atividade burocrática. É estar junto com os policiais na Justiça e em todos os pontos que o policial precisar. E isso fez com que eu estreitasse muito a relação com os policiais militares e acho que isso foi decisivo na escolha do meu nome e em minha eleição.

Na avaliação do senhor, o que representa sua eleição?

Nós fazemos parte de uma categoria que talvez seja uma das mais oprimidas. Por tudo, pela legislação, pelo executivo, por tudo... Até o nosso direito de falar, de dizer alguma coisa, é cerceado por conta do regulamento disciplinar que é ultrapassado, por conta do Código Penal Militar que é arcaico e que não se aplica à nossa atividade. Então, por conta disso, muitas vezes nós nem podemos falar a verdade. Por quê? Porque se falarmos a verdade - como aconteceu comigo - por algumas vezes eu fui preso.

Então, eu acho que os policiais militares precisam de representantes que levem seus anseios, seus clamores, as suas lutas, os seus sofrimentos. Eu acho que isso é muito importante. Mas, além disso, eu acho que nós temos muitos aspectos de nossa legislação que precisam ser revistos. Por exemplo: o policial militar e o bombeiro militar, em muitas situações, são tratados pior do que um bandido.

Vou dar um exemplo simples: o bandido, um criminoso qualquer, ele comete um crime que é enquadrado nas Leis 10.256 e na 9.099 (Leis do Juizado Especial); esse cidadão infrator vai ter direito a uma transação penal, vai pagar um sacolão, uma cesta básica ou qualquer coisa parecida, e estará livre. O policial militar, por uma falta administrativa, por uma falta no serviço, por alguma coisa administrativa que não chega nem a ser crime, ele pode perder a liberdade. Este é o segundo bem mais caro para um cidadão. Depois da vida, é a liberdade. Então, essas coisas têm de acabar.

Eu faço parte de uma corrente nova de oficiais, de policiais, que pensam nisso. Se o Estado quer uma prestação de serviço de qualidade, ele tem de dar condições para o policial. Tem de tratar o policial militar, o bombeiro militar com respeito, com humanidade, da forma que ele merece. Ele dá muito pelo serviço público, dá muito pelo Estado e recebe tão pouco em troca.

Nós, policiais militares e bombeiros militares, temos de fortalecer esse processo, que começou com a eleição de pessoas como Capitão Assumção. Ele foi talvez a maior voz que nós tivemos dentro desse Congresso. E eu acho que nós temos de fortalecer isso aí. Nós ainda não temos um deputado federal, mas eu espero que na próxima eleição a gente saia com a maturidade suficiente para saber que nós (bombeiros e policiais militares) precisamos ter um representante para falar por nós no Congresso Nacional.

Voltando ainda para a questão do nosso Estado, nós não temos nem carga horária definida. Nós estamos a mercê da boa vontade, do entendimento, do comandante. E se o comandante disser que a escala de serviço é de 24h por 24h, nós estamos sujeitos a uma escala que tem uma carga horária maior do que a estabelecida pela Constituição ao servidor comum (que é de 44h semanais).

Aqui no Acre temos policiais que trabalham 72h por semana. E metade dessa carga horária é noturna. Então isso tem de acabar.

Quais são suas propostas para o mandato de deputado estadual?

Vou fazer muita coisa. A questão da regulamentação da carga horária é muito importante. Os policiais militares do Acre, e nós temos isso comprovado pelas estatísticas da Diretoria de Recursos Humanos, têm o maior índice - dentre as categoriais do Estado - em separação judicial, pensão alimentícia, suicídio, etc. Tem uma série de índices negativos porque os policiais militares passam a maior parte de tempo da vida ativa dedicada ao serviço. Nossa carga horária é desumana e isso precisa acabar. Então a gente pretende apresentar um projeto de lei que estipule nossa carga horária em 30h, como um projeto federal que está tramitando no Congresso. Realmente, a gente vai trazer isso aqui para o Acre.

Nós queremos também rever a questão do nosso regulamento disciplinar. Em boa parte ele é inconstitucional. Às vezes ele trata, como eu já disse, o militar pior do que um bandido. Uma falta administrativa pode cercear a liberdade. Então a gente quer acabar com isso. Veja que muitas vezes o militar não pode nem fazer uma crítica construtiva. A nossa estrutura militarizada, de certa forma, privilegia o incompetente porque se tem alguém que está me incomodando e esse alguém é um incompetente, eu não posso nem dizer para ele que ele é um incompetente. Porque, mesmo que ele seja, eu vou ser preso, vou ser punido. A gente tem de acabar com esse regulamento e criar um instrumento mais digno, mais condizente com a nossa realidade. E se o policial militar tiver uma falha administrativa, o que todo mundo está sujeito, que ele seja penalizado. Mas da forma como outro servidor é: com repressão, advertência ou até mesmo corte no ponto. Mas não perdendo a liberdade.

Também temos a situação de risco de vida. Um soldado aqui recebe R$ 170 de risco de vida, enquanto que um coronel recebe mais de R$ 700. Quer dizer, está se tratando de forma desigual a vida. Vida não tem preço. Pode ser o coronel, pode ser o soldado. Tem de ser tratado da mesma forma. E se a gente for avaliar pela exposição ao risco, seria o contrário. Mas como não se pode fazer essa diferenciação no valor da vida, pelo menos que se pague igual. A gente vai brigar por essa isonomia. Mas tem uma infinidade de coisas que a gente tem de lutar pela segurança pública.

Uma delas seria a PEC 300?

A PEC 300 foi um marco. Eu acho que foi uma das coisas mais importantes que aconteceram para nós, policiais e bombeiros militares, porque ela possibilitou até a integração, a interação, dos trabalhadores dos diversos estados. E antes, nós éramos isolados. Cada um vivia a sua realidade e não compartilhava isso com os outros colegas, com os irmãos das outras corporações. E hoje estamos tendo essa oportunidade de conversar, por exemplo, com o Capitão Assumção, que é um colega do Espírito Santo. Um guerreiro do Espírito Santo. Estamos tendo a oportunidade de conversar com pessoas de todo o Brasil.

E eu acho que isso foi um marco até para a minha eleição. Essa PEC 300 teve uma importância decisiva para os policiais militares e bombeiros militares. Acho que ela inaugurou uma nova fase. Acredito ainda que os colegas das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares precisam ainda amadurecer um pouco mais. Por quê? Porque na maioria dos estados não houve um processo de selecionar aquela pessoa...

Por exemplo: aqui em Rio Branco nós tivemos uma oportunidade, na eleição passada para vereador, de eleger em votação interna um representante para o Corpo de Bombeiros e para a Polícia Militar. Foi o Sargento Vieira. E, dessa vez, a gente sabe que atendendo a exigência do governo, não foi feita essa votação interna. Mas, mesmo assim, a corporação soube quem estava do lado dela e nos elegeu. Nós tínhamos aqui mais de 14 militares concorrendo à vaga de deputado estadual. Isso prejudica. Tenho certeza de que isso não aconteceu só no Acre. Mas eu acho que a gente vai amadurecer e na próxima eleição sairemos com candidatos de consenso nos vários estados.

Quando à PEC 300, eu acho que ela perdeu a alma dela, que era a questão da fixação do piso. Mas a luta ainda continua e eu acho que ainda vale à pena brigar por ela. E graças a Deus que ainda podemos contar com pessoas como o Capitão Assumção. Quando ele esteve aqui no Acre, ele disse que não brigava pela Polícia Militar do Espírito Santo. Ele brigava pela Polícia Militar do Brasil. E que aqui ele se sentia em casa. Então, ainda bem que ainda podemos contar com ele. A gente lamenta muito a situação de ele não ter sido eleito. Queríamos muito contar com uma pessoa da garra dele, que foi realmente guerreiro a favor dos militares do Brasil inteiro.

Qual a importância dos policiais e bombeiros elegerem seus legítimos representantes?

Eu acho que toda categoria tem de se organizar e ter seus representantes. Nós vemos que temos bancada de ruralistas, bancadas de diversos segmentos. E nós, militares, que somos uma categoria das mais oprimidas precisamos dessa união. Veja que a legislação federal, principalmente, nos trata como servidores de segunda categoria. Veja que um policial militar com menos de dez anos de serviço sequer pode se candidatar. Se ele quiser se candidatar, ele tem de pedir demissão.

Então, temos de nos organizar e ter representantes. Porque só assim nós vamos corrigir um erro histórico: a dívida que a União tem para com os policiais estaduais, de tratá-los com indiferença, com pouco caso. Acho que o caminho é esse. Temos de batalhar e conscientizar nossa categoria, mais do que nunca, da importância de temos representantes para falar por nós. O militar estadual é limitado porque tem uma legislação penal militar, tem regulamento disciplinar que limita uma boa parte dos nossos direitos de cidadão. Mas um representante pode fazer esse papel, ele pode congregar gente. A gente tem de ter alguém que fale pela gente, tem de ter alguém que lute pelas nossas causas!

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