quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Quando a segurança pública será prioridade?


Fonte: O Globo.
Por Cecília Olliveira

As eleições de 2010 já tomam espaço nos noticiários. Vamos eleger presidente, governadores e, desta vez, também senadores. Mais uma vez as coisas mudarão de rumo e, com elas, a nossa vida. Além, claro, de nossa segurança.

Cada candidato ostenta uma bandeira para sua campanha e, ultimamente, a segurança tem sido uma bandeira unânime, embora não passe disso. Que esse é o ponto fraco de qualquer gestão, todos sabem. O que falta é alguém capaz de sacrificar sua imagem — já que os resultados de segurança pública não aparecem a curto prazo —, de realmente mudar a estrutura, a operação e a gestão das polícias. Se do jeito que está não há resultados, é necessário buscar outra direção.

Gestão

A gestão das polícias é um ponto essencial para o alcance de bons resultados. Hoje, 17 dos 26 estados brasileiros, mais o Distrito Federal, têm a pasta de segurança pública gerida por policiais federais, uma onda que começou em 2003, com Roney no Espírito Santo e Cavalcante, em Roraima. Dos 17 estados, 11 registraram aumento nos índices de assassinatos em 2008. Só no Rio de janeiro, o incremento foi de 8%. Não que o fato de ser gerido por um PF tenha relação direta com queda ou aumento de criminalidade ou violência em determinado estado. A pessoa pode ter uma carreira honrosa na Polícia Federal, o que não quer dizer que tenha capacidade técnica de gestão. E misturar as coisas não tem dado bons resultados.

Amadorismo e despreparo

Uma decisão errada, como a premiação por “atos de bravura”, criada pelo governo Marcello Alencar (PSDB), em 1995, pode ter efeitos desastrosos. O bônus, que ficou conhecido como "gratificação faroeste", estimulou mortes em supostos confrontos, registrados como autos de resistência. Isso ficou comprovado em levantamento feito pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser), intitulado Letalidade da Ação Policial no Rio, que mostrou que, desde que começaram as premiações, o número de mortos em ações policiais dobrou na capital, subindo de 16 para 32 por mês, e o índice de letalidade subiu de 1,7 para 3,5 mortos por ferido. Para validar os dados, o Iser comparou dois períodos: janeiro de 1993 a abril de 1995 (anterior à aplicação da gratificação) e maio de 1995 a julho de 1996, posterior.

Cabe ao governador, então, nomear alguém com competência técnica, e não apenas com experiência profissional na polícia, para gerir toda a estrutura de segurança estadual e mais: acreditar em sua competência. A confiança é importante para que casos como o de Eloá, no qual a mistura de política com polícia se mostrou, mais uma vez, ineficiente. Troca de favores e vaidade mataram uma cidadã.

A segurança pública ainda não é possível porque a grande maioria de nossos representantes políticos são especialistas em generalidades. O mesmo político que legisla sobre o Programa Nacional de Incentivo à Conservação da Natureza, por exemplo, quer legislar também sobre segurança. Não há impeditivos para tal, desde que o legislador tenha know how em ambas as áreas.

Não faz muito tempo, o senador petista Delcídio Amaral, quando da transferência de três traficantes para o presídio do Mato Grosso do Sul, seu reduto eleitoral, expôs sua preocupação. Ele publicou em seu Twitter: “Acredito que o mais sensato seria espalhar os presos de alta periculosidade entre os quatro presídios federais e não concentrá-los no MS”. Se o senador entendesse melhor sobre tráfico de drogas e crime organizado, saberia que foi exatamente este tipo de atitude — espalhar os presos — que disseminou as ideias e práticas do crime organizado pelo país afora. Hoje, temos braços do PCC na Bahia, por exemplo.

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E disse mais: “Dá pra entender? Os dez presos perigosos que barbarizaram o Rio separados em três presídios. Imagine o que farão no MS?". Bem, se os presídios são de segurança máxima, não há o que temer, há?

Investimento

Se você espera um retorno de algo, deve primeiro investir. Parece óbvio, mas não é. De acordo com dados do site Contas Abertas, em 2007 foram apresentadas quatro emendas parlamentares em segurança pública para o Estado do Rio de Janeiro, que somaram pouco mais de R$ 6 milhões. Duas delas eram sobre obras preventivas a desastres e duas sobre ações ligadas aos Jogos Panamericanos. Em 2008, dez emendas foram apresentadas e até 01/12/2009, apenas oito, das quais seis foram destinadas a ações de prevenção de desastres, e somente duas referentes ao aparelhamento das instituições de segurança pública. Juntas, somavam irrisórios R$ 1,6 milhão. Os políticos hasteiam, com muita propriedade, a bandeira da segurança pública, mas, na hora em que podem (e devem), pouco fazem.

Estados têm peculiaridades em sua segurança, como no caso do Rio, que, como é sabido, lida com profissionais do crime organizado. Triste é saber que o investimento em ações de inteligência caiu quase que pela metade de 2007 pra cá, passando de R$ 16 milhões para R$ 8,5 milhões. Ainda pior é ver que os investimentos em combate ao crime organizado ao tráfico ilícito de drogas e armas e à lavagem de dinheiro receberam apenas R$ 10 mil do governo federal em 2007 e absolutamente nada em 2008 e 2009. A União lembra-se de socorrer o Rio de Janeiro só quando explode alguma situação extrema, como no caso do Morro dos Macacos, e oferece os soldados do exército para contenção.

O Senado aprovou no início de dezembro, em plenário, projeto de lei que tipifica o crime organizado e estabelece novos instrumentos para seu combate. Será que vai mudar algo?

Salários

Outra coisa muito importante: bons salários. Com rendimentos maiores, os policiais cariocas, que receberam um aumento de 5% em novembro (o equivalente a R$ 1,51 por dia a mais no salário de um soldado), não precisariam morar na mesma comunidade onde fazem incursões, ou fazer bicos e ir trabalhar no dia seguinte, sem nenhuma energia.

Em 2008, o valor empenhado pela União em segurança pública, com pessoal e encargos sociais, foi de cerca de R$ 3,4 milhões. Em 2009, somou R$ 2,9 milhões. Ou seja, houve uma queda de 16% nos investimentos feitos na área. Se a meta é ter segurança, investir é regra básica. Mesmo que os estados possam investir na área separadamente, sem contar apenas com o orçamento federal, uma diminuição nos investimentos não faz sentido.

Foi aprovado no dia 02/12, pelo Senado, a PEC 41/08, que cria o piso nacional dos policiais civis e militares e dos bombeiros militares. Será que agora cai a diferença entre os cerca de R$ 1.300 que um soldado ganha aqui no Rio e os R$ 3.800 que o mesmo soldado poderia ganhar no Distrito Federal?

Quando segurança pública será, de fato, prioridade?

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